Elisa Andrade Buzzo: Notas errantes (2017)

Elisa Andrade Buzzo, formada em Jornalismo pela ECA-USP, estreou na literatura com os poemas de Se lá no sol (7Letras, 2005). Seu último livro de poesias, Vário som (Patuá, 2012), foi finalista do Prêmio Jabuti 2013 na categoria Poesia. Seus textos foram publicados em diversos livros, antologias e revistas literárias no Brasil e em países como Portugal, Espanha, Alemanha, México e Estados Unidos. Publicou o volume de crônicas Reforma na Paulista e um coração pisado (Oitava Rima, 2013).

 

Os poemas a seguir foram selecionados do seu novo livro Notas errantes (Patuá, 2017), a ser lançado em São Paulo no dia 10 de Junho, a partir das 19:00 horas, na Patuscada – Livraria, Bar e Café.

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cortaram-lhe as asas
                                     e ainda assim tecia harmonias no chão
e agora fitaria não as copas mas bem de perto as folhas secas
e douradas pisoteadas na praça e se da pele tiraram-lhe
o sentir nisto também viu algo proveitoso pois assim passaria por
entre as folhas pontudas dos jardins misteriosos sem sentir dor
ciceroniaria as abelhas em seu desejo de pétalas e se dos olhos
lhe tirassem a visão haveria o silvo dos animais desses
sons absolutos haveria de evocar a forma viva dos seres e se então
por sua vez a audição lhe fosse destituída teria sua imaginação a lhe render
uma nascente cristalina de onde brotaria diariamente como um desejo indevido
ressurgido das pedras

 
 
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já sou grande para
                                  andar nessa casa
as roupas quedam curtas nos braços
e apertadas na barriga quase esmago
os gatos ao mínimo abraço a piscina
torna breve tanque de águas estanques
minha paisagem interior é uma foto
colorida mas amarelecida as bordas
desgastadas o sorriso raro
sou esta que no caminho se deixou
ou que dos anos se esqueceu da passagem

 
 
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Para Greta Benitez

 

eu vi a poeta
                       na plataforma do metrô
não poderia eu ser reconhecida notei-a
vestindo feminino e claro
suas pérolas falsas e seus braços
a mulher que eu não conhecia e
não sorri com facilidade sua face
seus olhos conturbados onde percebi
linhas de ultrapassar a faixa amarela
tão vazia a plataforma tão sozinha
em seu jeito de esperar poderíamos
dar os braços mas separadas
somos mais fortes que reunidas assim
tumulares crepusculares um tanto
avessas à necessária publicidade

 
 
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detenho-me às folhas secas
                                                 olhares
nesta paisagem que se esqueceu deus de pôr gente
aqui tudo é natureza sento num tronco
de árvore escondo-me
entre ramagens na verdade a praça é
um corpo vivo feito de mil imagens
hortaliças de índios vergéis de colonos
verde séquito a se perder no horizonte
esta ainda é uma paragem distante
praça carlos drummond de andrade
ao lado da casa de vidro
de lina bo bardi

 
 

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são fios de ferro ou fios de lágrimas
                                                                retorcidos caídas de um rosto
lapso de tempo pendente contorcido sustentam
pedaços de reboco tudo é branco no funeral da casa
demovida é restos e gestos decepados
que boco-moco hoje uma casa de poucos cômodos

 
 

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aqui também tem luar
                                        e ali na água turva do lago
onde resplandece o sono cor de prata dos peixes
e na terra escura que embalsama as raízes e as formigas
e nas tranças agrestes das copas das árvores trigueiras
transportando fluorescente seiva
nesse pensamento onde a noite
de suavidade clara te presentifica
e nas conversas confusas das famílias que tiram fotos
fazem piquenique depois encontram suas casas
na imensidão da cidade na partida

 

 

Primata