Francesca Angiolillo (Niterói, 1972) é arquiteta, jornalista e tradutora. Em 2017, estreou na poesia com dois volumes editados pela 7Letras, Rua Lisboa, que saiu na coleção Megamíni, e Etiópia, vencedor do Prêmio Alphonsus de Guimaraens da Biblioteca Nacional em 2018.
Os poemas a seguir foram selecionados de Etiópia (7Letras, 2017).
ETIÓPIA, ETIÓPIA
Etiopía era a estação
de metrô da minha casa
quando eu me mudei daqui –
você logo
se lembrou
da Etiópia.
A estação de metrô tinha
uma cabeça de leão
como emblema
a sua Etiópia tinha
um filhote de chacal e
um imperador
segurando o filhote de animal
uma pedra no anel
no dedo do imperador
sobre a cabeça do filhote
– nela brilhava o sol.
O fascismo que você
deplorou do alto
de seus oito anos
na fila do leite
porque leite não havia
ergueu cidades
na Etiópia.
(No ano em que você nasceu
o imperador foi eleito
homem do ano
da Time Magazine;
depois disso
bem depois um tanto depois de
nascida eu
outras crianças passaram fome
sem direito a fila
no vale do rio Omo.)
Nunca soube das cidades
que você não ergueu
nas terras de Afar
onde Lucy nossa mãe
até hoje está
mas sei da pedra do anel
no dedo de
Haile
Selassie
como se eu estivesse lá
como se eu fosse você.
Sua Etiópia hoje é
uma fotografia
– nela você aparece
cercado de gente
negra pintada –
guardada
numa caixa
de papelão.