Claudio Willer é autor dos livros de poesia Anotações para um apocalipse (Massao Ohno Editor, 1964), Dias circulares (Massao Ohno Editor, 1976), Jardins da Provocação (Massao Ohno/Roswitha Kempf Editores, 1981), Estranhas Experiências (Lamparina, 2004) e A verdadeira história do século 20 (Córrego, 2016), também publicado em Portugal pela Apenas Livros – Cadernos Surrealistas Sempre, em 2015. Além de ensaísta, crítico e agitador cultural, realizou importantes traduções de obras como Os Cantos de Maldoror de Lautréamont, Escritos de Antonin Artaud e Uivo, Kaddish e outros poemas de Allen Ginsberg. Um pouco mais de seu vasto trabalho e colaboração cultural pode ser conferido neste blog.
Realizaremos um breve panorama de sua trajetória poética, dividido em 4 postagens. Nesta publicação, selecionamos alguns poemas de seus dois primeiros livros, compilados em Estranhas Experiências (Lamparina, 2004).
ensaio de “América”, a peça sobre geração beat, abril de 1967 – foto por Décio Bar
poemas de Anotações para um apocalipse (Massao Ohno Editor, 1964)
O VÉRTICE DO PÂNTANO
J’ai tant revê de toi
que tu perds ta realité
Robert Desnos
1
O pântano é um espelho despedaçado – nele flutuam imagens conduzindo ao além-mar das derrotas, dos dias de angústia mais negra. Eu me perderei pelos labirintos e pelas mansardas, em busca de uma lembrança cercada por antenas trêmulas e lampiões chineses. Abrem-se as corolas para mais um abraço mortal do destino, e a cidade estremece e recua diante da proximidade do Apocalipse, enquanto percorro as ruas de muralhas desabadas e canteiros desertos, as mansões que aprisionam tempestades de gaviões negros. A cidade e seus serpentários, sua coloração de sacrifício, suas vertigens, seus braços que não alcançam mais o próximo instante. Os telhados me sufocam e dão a certeza de que há gestos que são uma antecipação da morte e olhares que encerram abismos.