Telma Scherer é artista e professora do Departamento de Língua e Literatura Vernáculas da UFSC, na área de literatura brasileira. Atuou como professora substituta no Centro de Artes da UDESC, na área da linguagem pictórica. Trabalhou no campo da literatura e da performance, realizando apresentações de poesia e oficinas, para diversas instituições, entre elas o SESC/SC, o SESC/RS, a Bienal do Mercosul e a Prefeitura de Porto Alegre. Publicou o romance “Lugares ogros” (Caiaponte, 2019), o livro de artista “Entre o vento e o peso da página” (Medusa, 2018), e cinco livros de poesia: “Desconjunto” (IEL, 2002), “Rumor da casa” (7 Letras, 2008), “Depois da água” (Nave, 2014), “O sono de Cronos” (Terra Redonda, 2019) e “Squirt” (Terra Redonda, 2019). É formada em Filosofia (UFRGS) e em Artes Visuais (UDESC), com mestrado (UFRGS) e doutorado (UFSC) em Literatura, sobre a obra de Ricardo Aleixo, com período sanduíche na UPORTO, Portugal. Tem pesquisa na área da poesia expandida e da performance, bem como do contágio entre modos de escrita em literatura e artes visuais. Realizou pós-doutoramento no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais, linha de Processos Artísticos Contemporâneos.
Os poemas a seguir foram selecionados da obra “Squirt” (Terra Redonda, 2019).
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às vezes, uma fogueira aprofunda o vento. quando
se está a sós com os caderninhos é que se percebe
o quanto uma fogueira rasga o dia de pleno
alvorecer. seja no movimento dos sons, seja nos
ocos de alvoroços.
às vezes, uma fogueira se adensa de seu não ser.
é de quases, de nadas, de coisinhas finas e à toas.
às vezes, é no grau de uma fogueira assim, apagada,
em plena luz do olhar, que se percebe que
as varandas promovem a passagem dos rapazes.
e que eles vão roubar o doce de dentro das
madeiras, dos móveis, e subornam mamadeiras.
uma fogueira percebe que é tonto aquele que
coloca galhos e galhos desnecessários no vão do
dia. às vezes, uma fogueira faz besteiras, porque
não quer dizer o que ela é: verdade tanto para
dias quentes quanto para noites e para quando
a primavera se esquece de chegar. e nada disso
tem a ver com as pedras ou com as necessidades.
uma fogueira venera qualquer chão: e é no miudinho
da terra batida que ela abate mais uma
estrela. uma fogueira aprofunda o vento porque
ele não cessa de se esquecer. ela rebate as críticas
com seu sabor de brisa. uma fogueira sabe,
sim, aprofundar o vento. por isso, se apaga sozinha
ao contato do seu ímpeto, e se alastra pelas
margens, e se engasga no seu próprio squirt.