Alexandra Vieira de Almeida é poeta, contista, cronista, resenhista e ensaísta. Tem Doutorado em Literatura Comparada (UERJ). Atualmente é professora da Secretaria de Estado de Educação (RJ) e tutora de ensino superior a distância (UFF). Tem seis livros de poesia, sendo o mais recente A negra cor das palavras (Penalux, 2019). Seus poemas foram publicados nos importantes meios de comunicação: “Revista Brasileira”, da Academia Brasileira de Letras, “Jornal Rascunho” e “Suplemento Literário de Minas Gerais”. Publica constantemente em antologias, revistas, jornais e alternativos por todo Brasil e também no exterior. Tem poemas traduzidos para vários idiomas.
Os poemas a seguir foram selecionados da obra A negra cor das palavras (Penalux, 2019).
A NEGRA COR DAS PALAVRAS
A negra cor das palavras,
rasgando minha pele abismal
No sono dos mortais,
encontro a imortalidade da chama
que queima o corpo da manhã
Na noite dos apaixonantes véus,
o delírio do verso esférico
como a bola da lua em cristal de espumas
Não digo o verbo de espinhos
qual sangue que fere o tempo
Digo a palavra bruta
que tece os terçóis do sol
Na languidez do mapa,
o itinerário das negras letras
a faiscar um caminho para o Paraíso.
O PÁSSARO NEGRO
Ele era o barulho do vazio,
se fazendo lenda no voo da violência
Livre pelo ar,
adocicava a natureza
com sua cor bendita
Rei entre os pássaros,
não se gabava de ser peão
mas imperava no meio da floresta
com seu canto de hinos e versos selvagens
Mas o homem que não era lenda,
só escória no meio do mundo
dispara o tiro mortal
em que o vermelho da dor
era o sublime cântico da vida.
BACO
O vinho tinto da noite sã
atirava seres para a glória do mundo
No erotismo ácido das estrelas
colho o sumo da terra negra
Os cabelos soltos pressagiam um naufrágio
As páginas ainda estão molhadas de sono
É necessário o subterfúgio do prazer
que coloca a dor no seu verdadeiro
lugar mundano
A aventura da escrita
é percorrer as pupilas negras da noite
e acobertar os corpos
no abrasamento das chamas
Baco, diga-me
se nesta noite vaga
vaga a lua em meu peito inerte
se a cor noturna engrandece
os poetas na sua viagem rumo ao mistério.
NEGRO VERBO
O verbo era feito de carne, de carne negra
De tinta negra, da cor de meus olhos
O sol se envergonhava desta noite desperta
Pelos lábios carnudos de uma tulipa
O verbo se inteirava do equilíbrio do giro
Dos planetas ao redor do sol
Mas o sol queimava a pele, esse sol de outras manhãs
Queimava o papel anêmico
E fazia os esqueletos das páginas rirem
Saírem de suas tumbas e florescerem
Tulipas negras do humor e do escárnio
Poetisa maldita!
Sem esperança e sem chão
Usando um pseudônimo ácido
Como o veneno do escorpião
Negro verbo
A cortar a pele de açoites
No obscuro desejo da lamparina
Em mostrar ser luz
No meio da escuridão.
O AVESSO DA HISTÓRIA
No branco da manhã lépida
Escondo uma história da cor da noite
Em que o avesso dos dias
Costura a urdidura de um sol negro.