Nascido em 1987 na cidade de Herdecke, Alemanha Ocidental. Registrado cidadão brasileiro no Consulado em Munique. No Brasil desde 1991. Vive na cidade de Campinas. Formado em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas e em Literatura e Cultura Russa pela Universidade de São Paulo. Poeta, tradutor. Publicou os livro O presidente me quer morto (Urutau, 2019) e Notre Dame do Agreste (Primata, 2020).
Os poemas a seguir foram selecionados do livro Notre Dame do Agreste (Primata, 2020), disponível para aquisição neste link.
OS INIMIGOS DAS ÁRVORES
Os inimigos das árvores
são inimigos
dos amigos das árvores.
Os inimigos das árvores
são inimigos
também
dos inimigos das árvores.
Porque toda
e cada árvore
é de todo e de cada
amiga.
Os inimigos das árvores
são meus
e de todos
inimigos.
Os inimigos das árvores
são meus
e de si mesmos
inimigos.
Porque as árvores são minhas,
de todo e de cada
e de toda humanidade
amigas.
Os inimigos das árvores
são inimigos
das aves, macacos,
abelhas, formigas.
Porque as árvores são minhas
e de toda humanidade
e toda não-humanidade
amigas.
E de si mesmos inimigos,
porque a sombra de uma árvore
é de todos
e deles também
o abrigo.
Porque as árvores são
amigas de todos,
mas nem todos são delas
amigos.
Quem faz guerra com as árvores
antes faz guerra
consigo.
E a si mesmo,
a si mesmo e a todos
castiga.
Porque a vida do homem é rápida,
efêmera intriga:
é paz
e é guerra,
é amor
e é fome,
e com quê haverá
de encher a barriga?
As árvores dão
aos amigos
igualmente aos não-amigos,
igualmente aos inimigos,
amoras, pitangas,
goiabas e figos.
Porque a vida do homem
é paz
e é guerra,
é amor
e é fome,
efêmera intriga:
e não obstante
ele serra
das árvores todas
a mais verdejante
e antiga.
De frutos
a mais abundante,
de sombras
a mais generosa…
A todas eu amo,
de frutos e sombras,
de paz e amor as frondosas
amigas.
13 de julho 2019
CARIDADE SEM FRONTEIRAS
Eles detonam.
Dinamites no teu seio.
Das nascentes para os rios de dinheiro.
Das crateras e buracos,
das sirenes de ambulância,
dos incêndios nos barracos,
da merenda das crianças
para os rios
de dinheiro.
Dinamites no teu seio.
Eles detonam.
Compadecem dos incêndios
que eles mesmos os ateiam.
Para a torre da igreja a oferta,
uma pródiga soma.
Corações amolecendo,
de peitos abertos e abertas
carteiras.
Igreja repousa
na pedra
angular,
mas se a pedra desmorona,
a bolsa não quebra,
a bolsa é quem vem lhe salvar.
Caridade sem fronteiras.
Seca de esperar
por um grãozinho dessa verba
para ti, Paraopeba
de afogadas laranjeiras.
Eles detonam.
Dinamites no teu seio
e diamantes para a sua coleção.
De repente se emocionam:
os cristais, as pedras ricas
dos vitrais e das relíquias,
sua queda
de cortar o coração.
Da divina justiça faísca,
um sinal que reverbera
na cidade iluminada,
prenúncio de dias difíceis.
E das mãos benevolentes
para a missa a doação:
um milionésimo da verba
desde sempre destinada
à detonação de mísseis.
Dinamites no teu seio.
Eles detonam
hospitais e bibliotecas
e mesquitas no Oriente,
contra a gente esfarrapada os muros cercam
com farpas e cercas-elétricas.
Justa, apostólica bênção recebem:
milionésimo riquíssimo
escapou-lhes das carteiras.
E as cifras retornam ao Verbo:
o bolo do saque no saco do dízimo.
Caridade sem fronteiras.
Seca de esperar
por um grãozinho dessa verba
para ti, Paraopeba
de afogadas laranjeiras.
Eles detonam.
Dinamites no teu seio
e nas crateras o cimento.
Detonam construindo
e constroem detonando.
Morte traz renascimento
(por certo também uns por cento).
Constroem-detonam
seu mando e desmando.
Pouca coisa resta à tona.
Aplainam montanhas,
retingem arroios de cal e mercúrio,
mergulham países na lama.
Detonam-constroem:
a planta de seus edifícios
num vale de cepos erigem,
ascendem ao céu as roldanas.
Mas às vezes se condoem:
o bolo de notas roliço
para a torre reerguer com as efígies
da Catedral em chamas.
Dinamites no teu seio.
Eles detonam
mas ao bem se dedicaram
(uma vez na vida ao menos!)
e abriram as carteiras.
Nem um músculo moveram
pela paz universal,
só as contas bancárias
(não a mais cara
de suas brincadeiras).
Dizimam-saqueiam,
mas a torre estremeceu da Catedral
e o saco do dízimo está cheio.
Caridade sem fronteiras.
Seca de esperar
por um grãozinho dessa verba
para ti, Paraopeba
de afogadas laranjeiras.
Uma pena que, apesar da sua bolsa,
o poder de se fazer e desfazer
com as roldanas-dinamites,
esses rios de dinheiro,
toda a sua caridade,
a um rio de verdade
nem dez vezes essa soma o ressuscite.
Abril 2019
.
A aranha fez a toca
no buraco da tomada.
Veio a noite iluminada,
encravou-se nela o pino,
como o dedo do Divino
no buraco da tomada.
Nalgum lugar o dedo toca
(agora um dedo de menino),
e acenderam-se algures
pinheirinhos e abajures
de enfeites natalinos.
Salta então de sua toca
a aranha pinho acima,
pela elétrica rota
em caracóis tudo ilumina
e chegando ao cimo toca o
sino.
Sorri o menino.
16 de maio 2019
Reflexão,verdade na poesia! Eu amo