Camila Assad: eu não consigo parar de morrer (2019)

Camila Assad nasceu em Presidente Prudente (SP) em 1988. É autora de Cumulonimbus (Quintal Edições, 2017), eu não consigo parar de morrer (Editora Urutau, 2019) e foi contemplada pelo ProAC/SP com a obra Desterro, a ser lançada na FLIP pelas Edições Macondo.




Os poemas a seguir foram selecionados do livro eu não consigo parar de morrer (Editora Urutau, 2019)




.


Eu moro nos atrasos

e por isso ninguém nunca

                      me encontra

Eu me exilo no bolso

rasgado do teu terno azul

– aquele reservado para os

velórios dos parentes distantes

Eu sou minúscula

por vezes

  invisível

Eu moro na poeira

oculta dos idiomas

                  extintos

Eu submerjo das águas

da fonte central

da cidadela de

três mil membros

– dizimada há

mais de meio século

Quando fito o espelho

nem me percebo

sou maleável, sou

um elástico de cabelo

desses que se perde um por dia

                                        por aí


.


há prazer no inacabado por isso Florença

chorou ao perceber a última demão seca.

não se pode confiar nas aparências, ela me

disse, não confie porque sei que embaixo de

tanta camada não há beleza. sei a cor do tijolo bruto

o amarelo canário não disfarça as bolhas no cimento

que ela sabe, ainda resistem, ainda a encaram.


.



eu construo uma antessala

com balões de gás hélio

e reciprocidades

fico apanhada ao seu dedo mindinho

como se um furacão nos cingisse

e você fosse a esperança derradeira

as mesas estavam postas

mas foi tudo

             derrubado

Primata

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